PEQUENOS CIDADÃOS

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Vinícius Castelli

PEQUENOS CIDADÃOS

 
Crianças buscam se informar e falam de que maneira enxergam a importância da política para o futuro delas e do País
 

 
Discutir política nos dias atuais virou algo corriqueiro, até mesmo por quem nem se importava com isso há pouco tempo. As redes sociais, principalmente, se tornaram palco para falar de governos passados e também do que está em curso, assim como de suas figuras mais conhecidas. E isso é algo que tem acontecido de poucos anos para cá. 
Fato é que hoje, além dos adultos, as crianças estão antenadas. Mas não falam do nome X ou Y e de seus cargos políticos ou de partidos. Elas vão além e querem debater e pensar sobre as mazelas da sociedade e de seus anseios para que o que as incomoda possa ser resolvido. Elas pesquisam, leem, releem, buscam informações e traçam suas próprias opiniões. Algumas estão muito preocupadas em saber o que acontece por aí e como as coisas funcionam. Há quem discuta isso com os amigos, leia, e, é claro, converse sobre o que querem em casa, junto dos pais e avós. 
 
Iris dos Santos Juliano Grana, 13 anos, de São Bernardo, por exemplo, é um caso desses. Na sua opinião, política é o que serve para organizar a sociedade. Ela costuma se informar lendo jornal e pelo Twitter. A jovem sentiu necessidade de acompanhar o assunto e entender melhor para ter uma opinião própria e “para não ser influenciada por qualquer boato ou fake news”. Em casa, não deixa de debater com os pais. “Conversamos bastante sobre isso e eu sempre aprendo um pouco mais com eles”. Mas ela não é apenas esponja. “Gosto muito de ouvir o que eles sabem e também de acrescentar algo do que eu sei”, explica.
Assim como Iris, Giovana Antônio Massini, 9, de São Bernardo, também diz gostar de se aprofundar em política. Lê sobre e está sempre antenada ao que passa na televisão. Além disso, tem o hábito de conversar com os pais e os avós. Ela foi, inclusive, recentemente, eleita para o cargo voluntário de Prefeita Mirim da Cidade da Criança, no município onde vive, após votação popular. E já tem planos para o cargo.
 
“Meu projeto de campanha foi, e agora será trabalhar, a conscientização das crianças no cuidado e no zelo com o que é de todos”, diz. Quer ser também a porta voz da sociedade, acatando críticas e sugestões, e levando ao conhecimento da administração. Ela tem como meta, ainda, buscar ajuda do apresentador de TV Luciano Huck para o restauro de um avião que tem dentro da Cidade da Criança e que precisa de cuidados. “Com essa restauração, passará novamente o filme (o brinquedo exibia uma filmagem aérea da região) com um voo sobre a cidade de São Bernardo, e com isso as crianças de hoje poderão conhecer essa atração que parece ser bem legal”, explica.
Para Giovana, política é quando há várias pessoas falando sobre o Brasil ou sobre o país onde elas vivem. Algo que ela própria, ainda que sem saber, já faça. A Prefeita Mirim da Cidade da Criança conta que, se tivesse um cargo público, de fato, como prefeita ou presidente, “transformaria a educação, que é o futuro do nosso País”.
Ana Beatriz de Melo Bonifácio, 10 anos, moradora de Diadema, gosta e fala bastante sobre política. Em sua visão, esse assunto não é só sobre o ato de votar e escolher um representante. Vai além. “Quando você nasce, você já é um ser político. É muito mais do que apertar o botão na urna. É uma forma social de viver em conjunto com outras pessoas”, explica.
 
E a jovem adora discutir o assunto, tanto que prefere conversar com adultos do que com crianças. “Comecei a querer saber mais sobre o que acontece no Brasil por volta dos meus sete anos. Tive influência da minha família. Mas nunca fui forçada. Foi uma decisão que partiu de mim”, diz.
Com os amigos não fala muito sobre isso. Diz que em sua sala não há muita gente com o mesmo interesse. “Eles querem conversar sobre jogos, brincadeiras, e não veem política como algo sério. Eu que acabo sendo o ponto fora da curva, mas acho isso não muito saudável para eles”.
Entre seus anseios de melhora no Brasil, Ana Beatriz gostaria que cessasse o preconceito. Ela lembra, inclusive, que recentemente homofobia foi enquadrada como crime. A aprovação foi realizada dia 13 de junho pelo Supremo Tribunal Federal. “Mas acho que homofobia, machismo, racismo, intolerância religiosa, gordofobia, todos os tipos de preconceitos, deveriam ser barrados”, diz. Se pudesse, ela criaria projeto social para crianças e jovens para falar sobre essa questão e de como as pessoas sofrem com isso. 
A jovem diz mais. Ela acredita que todos deveriam ter direito a requerimentos básicos, bom ensino, esgoto, água encanada, alimentação saudável. “Só que, infelizmente, não são todos que tem essas condições”, diz. Se tivesse o poder de mudar algo na cidade onde vive,  criaria mais áreas verdes e diminuiria as construções, faria mais escolas e creches. 
Mas quando o assunto é educação, Ana Beatriz se entusiasma. “Pensa comigo. Se o problema está na segurança, há muitos ladrões, assaltos, por que é que, ao invés de atacar essa parte, não ataca o mal pela raiz? Isso tudo vem da educação”, reflete. Para ela, se as pessoas tiverem as mesmas oportunidades, a criminalidade tende a diminuir. 
Filipe Teles Veras Vicente, 11, de Santo André, também gosta de estar inteirado. Mas diferentemente de Ana Beatriz, política não é seu assunto predileto. Ainda assim, acredita que todas as pessoas deveriam se interessar pelo menos um pouco por falar e saber sobre ela, pois para ele, se as pessoas não votarem (conscientemente), “outras pessoas escolherão o representante por elas e pode não ser o que elas querem.”
O jovem acha política um assunto relevante “porque com a política a gente consegue fazer as leis, colocando ordem e trazendo progresso.” Para Filipe política é uma maneira de eleger uma pessoa a um cargo político para representar a população e lutar pelos direitos dela. A vontade de saber mais sobre o assunto surgiu quando seus amigos começaram a só falar do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) – ela foi destituída do cargo de Presidente da República em 31 de agosto de 2016. “Falavam que ela era ladra, então queria ver se isso era verdade”, conta.
 
 
Filipe revela que entre os amigos o assunto é recorrente. Mas, segundo ele, geralmente é falando mal de candidatos e não a respeito de suas ações. “São ataques pessoais”,
afirma. Por isso que em sua casa o assunto com os mais próximos não é só sobre brincadeiras ou passeios. Ele tenta sanar todas suas dúvidas sobre política também. “Nós conversamos e acho super legal discutir isso com minha família, pois consigo entender melhor aquilo que escuto de meus amigos, e muitas vezes vejo que não é bem assim”, diz.
Consciente, Filipe fala sobre abismo social. Em sua percepção, todas as pessoas deveriam ter direito a moradia, por exemplo. Tanto que se pudesse, construiria “uma residência para todos os moradores de rua, com direito a água, alimentação e higiene.”
Da mesma forma que Filipe, Iris também discute as diferenças sociais, algo que a incomoda um bocado. “Acho totalmente injusto esse papo de que ‘favelado é vagabundo’ e que ‘rico é quem se esforça mais’, porque não é assim que funciona”, acredita. Em sua opinião, nem todos têm as mesmas oportunidades na vida. “Por exemplo, um garoto que mora na favela, que não se dá bem com seus pais e vive pela rua, não tem a mesma forma de pensar que um garoto que nasceu em uma família de classe média/alta e que é educado de outra forma. Para mim isso tem de acabar, todos têm de ter a mesma oportunidade de ter uma boa casa, bom ensino ou trabalho etc. Afinal, ninguém escolhe como será seu começo”, reflete.
Outro ponto que ela toca é Saúde. E afirma que se pudesse fazer algo para melhor, faria. “Mesmo quando uma pessoa está passando por um problema grave e precisa de um tratamento ou cirurgia urgentemente, demora meses para ela conseguir marcar ou passar por algum procedimento. E eu digo isso com tanta certeza porque já vivenciei isso na minha família”, encerra. São pequenos cidadãos que dão, de fato,   verdadeira aula para muito adulto.


 




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