Porque é noite de balada

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Vinícius Castelli<br>Do Diário do Grande ABC

 Das ondas da antena da FM 97, no alto do prédio redondo, em Santo André, muita gente ouviu que se o motorista baixasse em 10 centímetros a antena do carro, a rádio pegaria melhor. Carlos Prozzo, 58 anos, que apresentava o programa Rockstrote e também cuidava das grandes festas de aniversário da emissora, diz que era uma brincadeira e isso fazia com que as outras emissoras, as de São Paulo, não pegassem bem na região. José Antonio Constantino, dono da emissora, não se lembrava mais dessa história, mas garante, entre risos, que a 97 pegava melhor sim.
Fato é que com antena alta ou baixa, muita gente ouviu cantos como ‘Porque é noite de balada, sorrisos na madrugada’, entoada tantas e tantas vezes por Catalau, ex-Golpe de Estado, na faixa Noite de Balada. A 97 FM fez o Grande ABC e a Capital conhecerem e se apaixonarem por bandas nacionais como o Golpe (foto acima) e tantas outras.
“Na época pré-internet, a rádio era o sonho de qualquer banda. Tocar uma vez já era a glória. Acho que o Golpe teve sorte de ser um dos mais tocados. Nos deixou conhecidos para sempre. E como rádio rock, divulgou muitas bandas nacionais”, diz Nelson Brito, contrabaixista do Golpe de Estado e único músico original na banda hoje em dia.
“O Golpe surgiu dali, da rádio”, garante Prozzo, que entrou na 97 quando tinha 24 anos. “A rádio era parte do Grande ABC”. Patrimônio, sim, assim como é a Metal Music – loja mais antiga de LP e CDs da região –, e como era também o extinto Move’s Bar, que ficava em Santo André e serviu de palco para shows como Dorsal Atlântica e Korzus, entre tantos outros.
Roger Moreira, cantor da banda Ultraje a Rigor, se lembra de visitar o prédio redondo. “Era uma rádio pioneira e certamente ajudou a firmar o rock na região”, diz. A FM 97 ganhou tanta força que seus aniversários, comemorados no Clube Atlético Aramaçan, levavam 8.000, 10 mil pessoas tranquilamente, como se lembram Constantino, Prozzo e as coberturas do Diário à época.
“Das festas da rádio eu participava de todas e todos os shows patrocinados por ela eu estava”, diz o locutor Ciro Bottini.
Tony Bellotto, guitarrista do Titãs, também, tem boa lembrança da emissora andreense. “A importância da 97 foi fundamental. Não só pelas músicas que tocava, mas pelos shows que patrocinava, as entrevistas.” Para o músico, a rádio ajudou, com certeza, a popularizar o rock brasileiro. “A banda visitou a rádio muitas vezes. Sempre muito divertido e excitante. Não tinha jabá na 97, só tocava o que agradava os programadores e o público.”
Prozzo se lembra de uma festa em particular. “Ninguém esquece do show do Raul Seixas. Ele já estava sumindo. Tinha que ficar dois, três dias com ele para que não bebesse. Esse dia teve Ira!, Golpe de Estado e Marcelo Nova, que me ligou e disse que o Raul apareceria na festa. Mas era segredo. Quando ele entrou o Aramaçan foi abaixo”, afirma.
O guitarrista da região Edu Romano, aliás, estava nessa ocasião. “Ninguém esperava, ou acreditava, que fosse realmente o Raul. Foi uma loucura. As pessoas começaram a subir umas nas costas das outras para ver melhor”, afirma.
O andreense Valter Nunes, de Santo André, 47 anos, era ouvinte assíduo da rádio e ia aos shows. “Conheci o Golpe de Estado pela 97, em 1987. Até tirei uma foto com o Catalau”, diz. O músico da região Evandro de Marco, 44, que era amigo do locutor Sandro Anderson, morto em 2009 em acidente de moto, também era frequentador dos shows. “Conheci Raul Seixas, Biquini Cavadão. Tinha acesso aos camarins”, diz.
O poeta Fabiano Calixto também viu muito show nas festas da rádio. “Rolava a madrugada toda. Todos meus
amigos iam. Era uma farra. Uma alegria. Eram, sei lá, umas dez bandas. Vi ali Golpe de Estado
(muitas vezes, era uma espécie de banda do nosso coração), Raul Seixas, Marcelo Nova, Ira!, Titãs, Barão Vermelho, entre outras.”

Com programação diferente, 97 está viva e opera na Capital

Muita gente acha que a FM 97 mudou de dono, mas José Antonio Constantino continua no comando da rádio, que neste mês completa 34 anos e hoje se chama Energia 97 FM. Desde 1994 tem programação calcada na música eletrônica. “Eu mudei (o estilo) porque não saia mais nada novo de rock naquele período”, afirma.
Um dia ele estava no táxi, conversando com motorista, que disse gostar de rock. “Perguntei o que ele escutava e ele disse que ouvia Yes, Jethro Tull. Percebi que não tinha nada novo. E pensei ‘já, já vou virar rádio flashback.’”
Na época, o novo, segundo ele, era a música eletrônica “Resolvi mudar da noite para o dia. O pessoal foi dormir ouvindo rock e acordou com música eletrônica”. Confessa que houve crítica. “Teve ouvinte que mandou carta com minha cara sendo enforcada. Me chamavam de traidor”. Segundo Constantino, que se lembra dos tempos em Santo André com carinho, foi decisão acertada.
“Se pudesse, hoje teria também um outro canal só de rock. Temos um aplicativo na rádio, que será lançado em mais ou menos um mês. Nele teremos playlists, e uma delas com rock. Quem quiser matar a saudade dos velhos tempos da FM 97 poderá agora”, encerra.

Carlos Prozzo, o homem responsável pelas festas

Segundo Nelson Brito, contrabaixista da banda Golpe de Estado, algumas das primeiras canções que a rádio tocou de sua banda foram Sem Ser Vulgar e Olhos de Guerra. Muitas vezes tocadas pelo locutor Jota Erre, outras por Carlos Prozzi.
Prozzi foi o responsável por organizar festas inesquecíveis no palco do salão nobre do Clube Atlético Aramaçan, em Santo André, nos anos 1980 e 1990, para os aniversários da rádio. “O público da região era fantástico”, diz.
Diversos nomes passaram pelas festas, como Ira!, Banda Taffo e Barão Vermelho. “O Grande ABC era o grande palco. Teve muita festa. Uma mais louca que a outra. Era uma disputa de artistas e gravadoras para tocar na festa. Todo mundo queria mas não tinha grade”, revela o produtor.
Segundo o criador da rádio, José Antonio Constantino, todos queriam participar das festas.
Além dos aniversários da rádio, Prozzi realizou também com sua produtora as tão esperadas Primavera do Rock. Além disso, passaram pela cidade, graças a ele, nomes internacionais como Deep Purple, Ramones e Faith No More. As lembranças dos eventos ele guarda todas com muito carinho até hoje.




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