Impasse digital

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Marcela Munhoz <br> Vanessa Soares <br> Karine Manchini

Como avisado há meses, o sinal analógico de televisão foi mesmo desligado em 39 municípios da Região Metropolitana de São Paulo, incluindo as sete cidades do Grande ABC. A partir de agora a transmissão da TV aberta passou para uma nova era, a digital, com promessa de som e imagem de cinema. A maioria conseguiu a tempo trocar o aparelho ou comprar um conversor para não ficar sem o jornal, a novela ou o programa favorito. Pois bem. O que muita gente não esperava, cerca de 20 milhões de assinantes das operadoras de TV por assinatura, para ser mais exato, era perder o acesso a três canais abertos: Record, RedeTV! e SBT. A verdade é que esse assunto foi o que mais deu polêmica 24 horas após o cancelamento do sinal analógico.

Até o desligamento, a lei 12.485, de 2011, garantia que os canais analógicos liberassem seu sinal de forma gratuita para as empresas de canal pago que, por sua vez, eram obrigadas a distribuir tais sinais sem qualquer custo para seus clientes. Com a mudança, a lei determina a livre negociação entre as partes, o que já acontece com a Globo e Band, por exemplo. É neste item que Record, RedeTV! e SBT batem na tecla. O apresentador Ratinho fez discurso inflamado sobre o assunto: “É uma sacanagem dessas operadoras pagarem a programação de outros canais e não a gente”, deu o recado.

Em nota, a Abta (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura) – representante da Vivo, Oi, Claro e Sky – informa que as empresas detentoras dos canais pagos já têm contrato com a maioria das TVs abertas sem qualquer ônus para seus clientes e que, com os canais citados acima, ainda não chegaram a um acordo. “Nossas associadas, operadoras de TV por assinatura, desejam restabelecer a transmissão desses canais e seguem buscando um acordo com essas emissoras de forma a não onerar seus assinantes.”

A única operadora que continua transmitindo o sinal das emissoras é a Vivo. Também em nota, a Simba – empresa formada pelas três emissoras – informa que a operadora reconheceu que é justo o pagamento pelo conteúdo e, por isso, o sinal para seus assinantes não foi cortado. “As negociações pelo conteúdo de Record, RedeTV! e SBT com a operadora de televisão por assinatura Vivo avançam de maneira positiva. Por essa razão, decidimos manter o conteúdo disponível aos assinantes da operadora pelos próximos dias, enquanto as negociações ocorrem.” Segundo a empresa, 36% das pessoas que pagam TV por assinatura consomem esses três canais rotineiramente.

MAS E OS ASSINANTES?
Na discussão entre os canais abertos e fechados quem perde é o consumidor. A dona de casa Magali Bernardi Cassola, 55 anos, está inconformada. Desde a mudança, não consegue mais assistir aos telejornais exibidos pelo SBT na parte da manhã. “Estou muito brava. Minha mãe, que mora nos fundos da minha casa, mesmo tendo canal por assinatura, comprou a antena para não perder a novela da Record, e eu fiquei sem os três canais”, reclama. A andreense ligou o dia todo para a NET para solicitar desconto, pois se sente lesada. No fim do dia, obteve a resposta: “Eles disseram que não teria nada de desconto. Falaram que nunca pagaram por canal aberto, mas que continuam negociando para chegar a um acordo. Eu falei para atendente que eu sou a favor de eles pagarem sim, já que pagam para canais fora do Brasil”, diz. Segundo ela, se os canais não voltarem nos próximos dias ela vai tomar uma providência. “Vou cancelar ou colocar antena.”

Para os clientes que se sentirem lesados por perder o sinal das emissoras da Simba, o Procon-SP explica que, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, no caso de alteração ou redução da grade de programação o assinante “poderá, alternativamente e à sua livre escolha, solicitar cancelamento do contrato sem ônus ou desconto proporcional na mensalidade”. Para mais informações, acesse www.procon.sp.gov.br ou ligue 3356-9200 (unidade de Santo André).

Planejamento necessário para não ser pego de surpresa
Em relação à troca dos aparelhos e compra dos conversores, o andamento está seguindo o que foi planejado desde o anúncio, em 2015, de que o sinal analógico seria desligado. “Começou em Rio Verde, Goiás, depois Brasília e, agora, São Paulo. Apesar de ter sido amplamente divulgado, não deixa de ser um assunto técnico, então, muita gente ainda está com algumas dúvidas”, acredita Filipe Crespo, professor de Mídia e Planejamento da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), que recomenda o site www.sejadigital.com.br. Até 2023, segundo ele, todas as televisões devem estar com sinal digital. “Melhora mesmo a qualidade da imagem e do sinal. Claramente se nota a diferença”, afirma.

“Gostei do que vi”, afirma Geni Martins da Silva, 69 anos. Ela usou suas economias para trocar a televisão antiga há duas semanas. “O dinheiro estava reservado para a reforma da casa, mas usei. Comprei a vista e garanti minha novela”, conta a moradora de Santo André. E tem gente que comprou TV há mais tempo. É o caso de Mariana Neri Souza, 28. O aparelho mais novo e já adaptado com conversor chegou em dezembro. “Acredito que essa troca não deveria ter sido prioridade no Brasil neste momento. Precisamos do mesmo empenho em outros assuntos, como Saúde e Educação, por exemplo”.

Thamiris Galhardo, 21, de São Bernardo, também não estava pensando em investir nisso agora. Ela gastou cerca de R$ 1.700 para adaptar os aparelhos que tem em casa e na residência de seus avós, totalizando a compra de uma televisão para ela e três conversores para eles. “Acho que os responsáveis deveriam ter pensado em aparelhos que conseguissem converter o sinal de todas as televisões de uma mesma casa, como se fossem roteadores de sinais”, explica.

Uma moradora de São Paulo de 40 anos, que preferiu não se identificar, acha que se a mudança é para melhorar a qualidade da imagem para os telespectadores, é válido que aconteçam as alterações. “Não tenho TV a cabo e sofri com isso. Tenho três televisões e só uma ficou com o aparelho, porque achei caro o conversor. O mais barato que encontrei foi R$ 138, então vou esperar mais um pouco para comprar os outros”, conta.

Ontem o Diário percorreu lojas da região e constatou que a procura pelo conversor aumentou nos últimos meses e encontrou aparelhos com valores que variam de R$ 100 a R$ 190. Porém, na maioria dos estabelecimentos os produtos mais baratos estão em falta. Lembrando que quem é cadastrado em algum programa social vinculado ao governo federal pode pegar o kit gratuitamente. No Grande ABC, 181 mil famílias têm esse direito. O material pode ser retirado nos Correios, mas é preciso agendar antes pelo telefone 147. A entrega dos produtos vai acontecer por mais 45 dias após o desligamento digital. 




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